Em 1962 as principais manchetes foram estas:

Argélia obtém independência. A luta continua

Quinze dias para abalar o mundo

Revolução nas comunicações

Cai um bastião do racismo nos EUA

Os EUA correm atrás do prejuízo

Bond, James Bond. O resto é fantasia

Loura, insone, linda e deprimida

A tímida estreia do fenômeno Beatles

Warhol transforma clichê em arte
Garrincha baila; os outros ‘dançam’

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1962

Argélia obtém independência. A luta continua

Munidas de poucas armas e muita indignação, os nove jovens que lideraram, em 1954, a revolta que se transformaria em oito anos de guerra e poria fim aos 132 anos de domínio francês na Argélia jamais poderiam prever que 45 anos depois o pais ainda viveria uma espécie de guerra de libertação. Não ha colonizador na Argélia da nova ordem mundial. Mas ha terror, massacres, crianças degoladas e a sombra da morte pairando por quase todos os cantos.

Ha cinco décadas, o inimigo era uma Franca desinteressada, que desprezava os árabes e seus problemas e lançava a colônia de planícies férteis a beira de um abismo. Hoje, o mal e uma guerra civil, resultante do confronto entre o regime militar e o fundamentalismo islâmico, que já tirou a vida de milhares de pessoas. Desde a guerra de independência, a Argélia não sabe o que e a paz plena.

Didouche Murad, Bem Boulaid, Rabah Bitat, Ahmed Ben Bella, Mohamed Boudiaf, Khider, Krim Belkacem, Ben M'Hidi e Ait Ahmed eram os nove jovens idealistas—e desesperados—que fariam a Franca pagar um preço alto pelo tratamento dispensado a colônia. Eles representavam, portando a bandeira da Frente de Libertação Nacional (FLN, principal movimento anticolonial), a insatisfação dos argelinos que haviam perdido a fé na França. Alem de revoltados com a miséria que os cercava, eles esperavam, desde 1947, que entrasse em vigor um estatuto permitindo que tomassem parte na vida política. Para eles, uma comunidade de maioria muçulmana deveria ser administrada por muçulmanos e não por burocratas europeus.

O conflito foi deflagrado na tarde do Dia de Todos os Santos, 1° de novembro de 1954, com atos terroristas em vários pontos do território. Enquanto postos policiais, instalações militares, armazéns e representações do Governo francês eram destruídos, os rebeldes conclamavam os muçulmanos a integrar uma batalha nacional pela restauração do Estado argelino. O então ministro do Interior francês, o socialista François Mitterrand, respondeu prontamente: "A guerra e a única negociação possível."

A luta pela independência da Argélia acabou provocando a queda, em 1958, da 4a Republica Francesa e a volta do general De Gaulle ao poder. Herói da resistência aos nazistas na Segunda Guerra Mundial, De Gaulle, prevendo que jamais venceria a batalha contra os rebeldes argelinos, neutralizou a resistência de militares conservadores que se opunham a qualquer acordo com a colônia. Excelente estrategista, ele propôs um referendo para saber o que pensavam os franceses. Em 1961. obteve carta branca para negociar o cessar-fogo, assinado em marco de 1962. Em julho do mesmo ano os argelinos disseram sim a independência proposta num referendo. Estava encerrado o conflito que devastara a Argélia, custara quase dois milhoes de vidas e deixara milhares de desabrigados.

No inicio dos anos 50, o Governo francês subestimava de tal maneira o território que não se preparou para o levante iniciado nos vales e nas montanhas do Aurès e depois fortalecido por toda a colônia. A França sequer sabia quem eram os lideres da FLN, que dispunha, no inicio do conflito, de apenas 800 homens, 400 armas e bombas artesanais.

Na verdade, os primeiros movimentos mais expressivos pela libertação da Argélia haviam surgido na década de 20, como a Estrela Norte-Africana e a Federação dos Eleitos. Esses movimentos revolucionários e os que vieram depois reforçaram o sentimento nacionalista, combinando facções islâmicas e comunistas e dando origem a FLN, fundada em 1954. Seus lideres declararam do Egito (onde a frente estava baseada) a guerra pela independência. Logo surgiu o Exercito de Libertação Nacional, braço armado da FLN e responsável pelos atos terroristas e de sabotagem desencadeados por todo o pais. A FLN manteve-se atenta em outra trincheira: a conquista da parcela da população hostil aos franceses e dos indiferentes aos apelos pela independência.

Diante das inúmeras dificuldades que a luta impunha, não tardou para que os franceses percebessem que não adiantava manter 600 mil homens mobilizados contra um inimigo que parecia se multiplicar pelo interior do pais. Os rebeldes argelinos estavam pessimamente armados, não eram numerosos, mas sabiam agir. Eram como carrapatos enlouquecendo um touro.

No cenário político, a crueldade das tropas francesas e a falta de habilidade de Paris para resolver a questão nos primeiros anos acabaram expondo a face brutal da Franca colonial. Um dos momentos de maior avanço dos franceses mas de péssima repercussão internacional foi a violenta repressão, entre janeiro e setembro de 1957, aos militantes da FLN, na operação que ficou conhecida como Batalha de Argel. Boa parte da frente foi desmantelada. Campos de concentração, torturas e matanças de civis suspeitos de ajudar rebeldes provocaram comparações inevitáveis com o nazismo e os outros regimes totalitários. A causa dos rebeldes, em plena Guerra Fria, era a dos oprimidos. A libertação da Argélia funcionaria como um sonoro não ao imperialismo. A luta pela independência obteve a simpatia das esquerdas: se a França fosse derrotada, o troféu seria entregue a Moscou.

De Gaulle voltou ao poder com a missão de salvar o pais dos olhares reprovadores do mundo . E logo percebeu que o fim do conflito era o único caminho. Mas por trás da sua euforia com o acordo havia a preocupação com os obstáculos que vislumbrava no caminho da paz. Imediatamente após o anuncio do cessar-fogo e a libertação de lideres nacionalistas argelinos, a Organizac3O do Exercito Secreto (OES), formada um ano antes sob a liderança de generais direitistas contrários a independência, proclamou a decisão de manter a luta armada contra a libertação. Os atos terroristas empurraram para fora da Argélia, de volta a França, cerca de um milhão de pieds noirs (pés negros, nome dado aos franceses nascidos na Argélia). Mas a campanha da OES não teve fôlego. Três meses depois, capitulou.

Em julho de 1962 foi eleita uma Assembléia Constituinte com membros da Frente de Libertação Nacional. A constituição definiu o pais como um estado socialista e muçulmano, com um único partido legal, a FLN. Um dos lideres da independência, Ben Bella, tornou-se o primeiro presidente da Republica Democrática Popular da Argélia, mas em 1965 foi deposto por militares e substituído pelo general Huari Boumediene, que nacionalizou empresas petrolíferas, distribuiu propriedades dos ex-colonos e fortaleceu o regime de partido único nos moldes de Moscou. As tropas rebeldes já tinham se transformado em Exercito regular, armado pela URSS.

Desde então, o poder pertence aos militares. E os argelinos vivem espremidos entre as barbaridades cometidas pelos homens de farda e as atrocidades perpetradas pelos radicais islâmicos. A Argélia vive uma outra guerra.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1962

Quinze dias para abalar o mundo

A espécie humana nunca esteve tao ameaçada de extermínio coletivo como nos 15 dias de outubro de 1962 que entraram para a História como a Crise dos Mísseis. Foi um verdadeiro duelo a moda do Velho Oeste: quem piscasse primeiro corria o risco de ser varrido do mapa. Nele, pela primeira e única vez durante o período da dissimulada Guerra Fria, as duas superpotências mundiais estiveram em rota de colis3O direta.

A crise que abalou o mundo começou na manha do dia 14, quando chegaram a Casa Branca as fotos aéreas tiradas por uma missão de espionagem sobre a província de San Cristóbal, no extremo sul de Cuba, a apenas 150 quilômetros dos Estados Unidos: havia de 24 a 42 mísseis nucleares soviéticos apontados na direção de Washington e Nova York.

Seguiu-se uma semana de intensa movimentação na Casa Branca, na qual se reuniram o presidente John Kennedy, seus principais assessores e o alto comando militar dos EUA. Demonstrando uma firmeza que não tivera durante a invasão da Baia dos Porcos, o presidente ouviu com frieza as avaliações sobre o episódio e decidiu por conta própria impor um bloqueio naval a Cuba, ordenando que 200 mil soldados ficassem de prontidão na Flórida. Dias depois, em pronunciamento pela TV, avisou que o estado de alerta só seria levantado quando todas as armas atômicas fossem desmontadas e levadas de volta para a URSS.

Começou então uma semana de delicadas negociações diplomáticas, durante as quais nenhuma das duas nações podia ser considerada vencedora ou perdedora—mais do que nunca, o equilíbrio do terror tinha que ser mantido. No entanto, era bem mais sensível a situação da União Soviética, onde Nikita Kruchov buscava reafirmar a liderança dentro do próprio Partido Comunista, mostrar forca aos comunistas chineses liderados por Mao Tsé-Tung e, ao mesmo tempo, proteger os cubanos, que, depois da fracassada invasão americana a Baia dos Porcos, temiam uma nova investida dos Estados Unidos.

Durante a dramática troca de cartas entre a Casa Branca e o Kremlin, houve dois momentos em que tudo pareceu perdido. Um deles foi quando Kruchov afirmou que não podia voltar atras e que, portanto, a guerra seria inevitável. O outro, quando os cubanos derrubaram um avi3O de espionagem U2 que tinha invadido seu espaço aéreo. Em Washington, respirou-se fundo e continuou-se a negociar. Em 28 de outubro, as duas superpotências anunciaram uma saída honrosa para ambas: os EUA assumiram o compromisso de não invadir Cuba e de retirar os foguetes Júpiter, instalados na Turquia; a URSS, por sua vez, ordenou a desmobilização das bases nucleares em Cuba. O mundo pode enfim dormir em paz.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1962

Revolução nas comunicações

No dia 11 de julho de 1962 os Estados Unidos puderam ver, pela televisão, uma instável imagem do ator Yves Montand, que, da França, dava tchauzinho para os americanos. Ao mesmo tempo, do outro lado do Atlântico, os europeus foram contemplados com uma imagem da bandeira americana tremulando sobre um prédio. Os que ligaram a televisão nessa data se tornaram testemunhas de uma nova era, a das transmissões via satélite, concretizada com o lançamento, um dia antes, do Telstar I, da American Telephone and Telegraph Co. (AT&T).

O Telstar I tornava reais ideias surgidas já no inicio do século como a do escritor americano Hugo Gernsback, um pioneiro da ficção cientifica que previu, no livro "Ralph 124C41+", de 1911, transmissões de radio através do espaço. Ou do escritor-cientista inglês Arthur C. Clarke, que décadas depois, em 1945, propôs o uso de um satélite para comunicação entre pontos distantes da Terra usando a energia solar para amplificar as ondas recebidas. Era o que o satélite americano fazia Ele recebia as ondas (sinais fracos de TV) e, utilizando energia solar, as amplificava 10 bilhões de vezes, mandando-as de volta para lugares definidos. Bem diferente dos satélites anteriores, que na hora da retransmissão espalhavam o sinal para diversas direções. Alem das imagens de TV, o Telstar I transmitia também, pela primeira vez através de ondas, ligações telefônicas da Europa para os Estados Unidos e vice-versa.

Na ansiedade de superar os soviéticos (que, em 1957, haviam lançado o Sputnik I, primeiro satélite artificial), o Governo americano acabou apoiando o projeto da AT&T (menos eficiente, de órbita mais baixa, porem mais lucrativo) em detrimento do seu próprio sistema, ajudando a transformar a já gigantesca empresa no império de comunicações que e hoje. O Telstar I funcionou em base experimental, ate 21 de fevereiro de 1963. Um segundo satélite Telstar foi lançado menos de três meses depois, operando durante dois anos. A partir dai, o sistema de satélites se desenvolveu com velocidade, tornando-se comercial.

A demanda pelo novo meio levou a criação. em 1964, da Intelsat, joint venture que tem hoje a participação de 143 países, entre eles o Brasil, 11° no ranking de investidores, através da Embratel. Depois do colapso da União Soviética, em 1991, os antigos países do bloco comunista também aderiram. O século XX termina com centenas de satélites artificiais girando em torno da Terra.

 

 

 

 

 

 

 

  1962

Cai um bastião do racismo nos EUA

Em setembro de 1962, o presidente americano John Kennedy precisou enviar ao Mississippi 750 homens da Guarda Nacional. Tratava-se de uma desordem publica—no caso protagonizada pelo governador daquele estado, Ross Barnett, que tentava impedir a entrada do negro James Meredith na Universidade do Mississippi, reduto de brancos. Meredith, 29 anos, era o primeiro aluno negro daquele estabelecimento de ensino. O episódio, de profundas raízes racistas, já tivera um prólogo cinco anos antes, em outro estado do Sul, Arkansas. Ali, em setembro de 1957, na cidade de Little Rock, mil soldados precisaram escoltar nove crianças negras para garantir sua entrada numa escola da cidade—o governador Orval Faubus, desrespeitando uma decisão da Suprema Corte em 1954, ordenara que a policia estadual barrasse o ingresso das seis meninas e três meninos na Central High School.

Em Arkansas, a violência se restringira a atitude racista e um ferido. Já no Mississippi, duas pessoas morreram e mais de 150 ficaram feridas no confronto entre brancos racistas e policiais encarregados de proteger o aluno negro. Tropas federais permaneceram no campus ate a graduação de Meredith em Ciência Política, em 1963, mesmo ano em que Martin Luther King pronunciou seu famosíssimo discurso: "Eu tenho um sonho." O governador Barnett, vencido, fez uma declaração pelo radio, na qual afirmou, arrogante: "Nós nunca vamos nos render."

Meredith, este não se rendeu. Em 1966, foi um dos lideres da "Marcha contra o medo" de Memphis, no Tennessee, ate Jackson, no Mississippi. No caminho, foi baleado por um desconhecido. Outros lideres, como Martin Luther King, Stokely Carmichael e Floyd McKissick, prosseguiram a marcha, 3 qual Meredith se juntou depois de recuperado dos ferimentos. Mas arriscar a vida não era uma novidade para ele, que servira na Forca Aérea americana de 1950 a 1961. No mesmo ano de 1966, narrou suas experiências no livro "Three years in Mississippi" ("Três anos no Mississippi").

Em 1972, Meredith tentou, sem sucesso, uma indicação para concorrer ao Senado pelo Partido Republicano. Passados 17 anos, integrou-se a equipe do senador ultraconservador Jesse Helms, em uma atitude que despertou controvérsias. Mas em 1997, pode colher os frutos do gesto de coragem: 35 anos depois de ser agredido e humilhado, voltou a mesma universidade, dessa vez para doar seus arquivos pessoais a instituição. Foi ovacionado.

 

 

 

 

 

 

 

 

  1962

Os EUA correm atrás do prejuízo

Depois de perderem para os soviéticos os louros pelo lançamento do primeiro homem ao espaço (Yuri Gagarin, em abril de 1961), os Estados Unidos empenharam-se com a velocidade de um foguete na corrida espacial, que teve em 1962 um ano significativo. Em fevereiro, o futuro senador John Glenn tornou-se o primeiro astronauta americano a entrar em órbita, dando a volta ao mundo três vezes em quase cinco horas. Meses depois, a sonda Mariner II orbitou o enevoado planeta Venus a cerca de 35 mil quilômetros, mostrando que as ambições espaciais estavam bem alem da Lua. Os soviéticos tinham sido os pioneiros. mas a Nasa, a agencia espacial americana, provava que o atraso registrado nos primeiros anos da conquista do espaço ia ficando cada vez menor.

O ex-piloto da Marinha John Glenn foi lançado ao espaço na manha do dia 20 de fevereiro, na Friendship VII, uma nave com apenas um metro cubico de espaço interno Glenn percorreu uma distancia de 129.000 quilômetros, a velocidade media de 28.000 km/h, chegando a se distanciar 260 quilômetros da Terra. Na volta, pronunciou uma frase de menos efeito que a celebre "a terra e azul" do colega soviético, mas igualmente comovida: "Não sei o que se pode dizer de um dia em que você viu quatro lindos pores-do-sol."

O aparato mobilizado para garantir a recuperação da capsula, no Oceano Atlântico, a leste das Bahamas, foi a altura do acontecimento: 24 navios, 126 aviões e 26.000 homens estavam a postos ao largo das ilhas para resgatar o novo herói nacional. John Glenn saboreou o êxito, mas deixou a Nasa dois anos depois. O astronauta, que possuía um alentado currículo de missões de combate na Segunda Guerra Mundial e na Guerra da Coréia ficou irritado por não o escalarem mais em nenhum vôo. Mais tarde, viria a descobrir que era o próprio presidente John Kennedy quem não o queria no espaço. Naqueles tempos em que as viagens fora da Terra eram bem mais arriscadas, a perda de um herói daquela envergadura poderia ser chocante para a nação e, e lógico, para o programa espacial americano. que prosseguiu em ritmo intenso.

A exploração americana do espaço teve mais um êxito no dia 27 de agosto, com a Mariner II, primeira sonda planetária bem-sucedida. A anterior, a Mariner I, havia explodido. A nova missão comprovou a existência de um vento solar em Venus detectou uma temperatura de 475 graus centígrados, capaz de derreter o chumbo, e mostrou que Venus tinha um ano de 250 dias, com rotação de Leste para Oeste. Os fatos mais marcantes daquele ano representaram grandes avanços numa época em que a conquista do espaço ocupava as manchetes dos jornais.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  1962

Bond, James Bond. O resto é fantasia

Ele não dispensa o smoking, nem os ternos clássicos cortados em Saville Row. A bordo do carro favorito, o Aston Martin DBV, nunca se separa da sua mortal Walter PPK. Conquistador contumaz, esta sempre cercado de belas mulheres e após um dia de trabalho recheado de perseguições, explosões e lutas corporais com inimigos perigosos, toma um martini para relaxar. O seu nome e Bond, James Bond. O agente secreto a serviço de Sua Majestade que também atende pelo codinome 007, virou fenômeno mundial em 1962, com o lançamento do filme "O satânico Dr. No".

O sucesso mundial da produção de Albert Broccoli também fez a fortuna do jornalista inglês Ian Fleming, criador do personagem. O longa "007, o espião que me amava" (1977), por exemplo, custou em torno de US$ 20 milhoes e rendeu US$ 150 milhoes. Broccoli produziu 13 filmes da serie (o ultimo deles "007 contra Octopussy", de 1983), passando o bastão a outros produtores. Desde que apareceu nas telas, o agente com permissão para matar teve também vários diretores, entre eles John Glen, Terence Young e Guy Hamilton. E foi interpretado por Sean Connery, George Lazenby, Roger Moore, Timothy Dalton e Pierce Brosnam. Mas foi Connery, o primeiro, que o encarnou de maneira inconfundível.

As fantasiosas aventuras de Bond o levam a percorrer os quatro cantos do mundo para derrotar vilões empenhados em destruir o planeta. Contra eles, o agente usa o arsenal bélico desenvolvido pelo cientista Q: canetas que disparam, carros com assentos ejetáveis cigarreiras explosivas. A galeria de personagens inclui belas agentes inimigas, das quais Ursula Andress, a primeira, e a mais famosa.

Ex-soldado do serviço de espionagem inglês na Primeira Guerra e ex-corretor da bolsa, Fleming começou a escrever romances policiais para, dizem as mas línguas, se livrar de um tedioso casamento. O primeiro, "Cassino Royale", em 1953, iniciou a saga de 12 volumes do herói másculo, intrépido, irreverente e celibatário. O sucesso de 007, no entanto, só aconteceu quando o escritor Raymond Chandler prefaciou uma edição americana de "Viva e deixe morrer". Isso foi tempos antes de o primeiro livro virar serie de TV, nos Estados Unidos, com o nome "Clímax"—a interpretação do agente pelo ator Barry Nelson quase fez um desgostoso Fleming matar sua criatura.

O êxito e a longevidade da fórmula centram-se na mistura de aventuras. sexo e luxo. Os livros foram traduzidos para 24 idiomas e os filmes já venderam mais de um bilhão de ingressos no mundo. A serie continua a ser escrita por um discípulo de Fleming, John Gardner.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  1962

Loura, insone, linda e deprimida

A morte de Marilyn Monroe foi a primeira cena de um filme sem fim. As especulações sobre o que aconteceu na casa do maior símbolo sexual da história do cinema, na noite entre 4 e 5 de agosto de 1962, renderam dezenas de livros, artigos, documentários e muita fantasia. Marilyn já foi morta pelo FBI, pela CIA, pela Máfia e ate por comunistas, em complicadas conspirações, sempre envolvendo os irmão Robert Kennedy, então secretario de Justiça, e John Kennedy, presidente dos Estados Unidos. A verdade, comprovada por todos que conviviam com ela. e que Marilyn vinha sofrendo de depressão e insônia ha vários anos e, segundo seu psiquiatra, Ralph Greenson, teria ingerido, naquela fatídica noite de sábado para domingo, cerca de 50 comprimidos do calmante Nembutal, cujos vidros vazios. junto com outras drogas, foram encontrados na mesinha ao lado da cama em que estava, nua e com a mão estendida para o telefone.

Greenson falou com Marilyn pela ultima vez na tarde de sábado. A atriz se queixou de insônia e o medico sugeriu um passeio de carro com a sua acompanhante, Eunice Murray, que morava sozinha com Marilyn num elegante subúrbio de Los Angeles. A noite, a atriz desistiu do passeio e disse que iria dormir. Por volta das 3h, Eunice viu a luz do quarto acesa e chamou Greenson e Hy Engelberg, medico particular da atriz. Quando eles chegaram, o corpo já estava rígido, indicando que a morte ocorrera algumas horas antes.

A morte repentina, aos 36 anos, chocou os fãs da atriz. Marilyn acabara de ser dispensada das filmagens de "Something's got to give", devido a problemas com drogas e atrasos freqüentes. "Os desajustados", de 1961, dirigido por John Huston, acabaria sendo seu ultimo trabalho completo, apesar das filmagens atrasadas pelo mesmo motivo. Mais tarde, livros como "Marilyn", do escritor Norman Mailer, levantariam hipóteses em cima de hipóteses. Em todas as biografias, ha menções a segredos políticos, confidenciados a ela por Bob Kennedy, com quem teria tido um romance.

Nada foi comprovado. É provável que essas histórias tenham estimulado a imaginação de muita gente, mas a versão oficial foi a mais coerente com o instável passado de Marilyn Monroe. Nascida em 1926, em Los Angeles, com o nome de Norma Jean Baker, filha de pai desconhecido e de uma mãe com problemas mentais, Marilyn passou a infância com varias famílias (numa delas, houve tentativa de abuso sexual). A isso. somaram-se, já adulta, a passagem por três casamentos, dois deles com celebridades (o astro do beisebol Joe DiMaggio e o dramaturgo Arthur Miller), igual numero de divórcios e o fato de ser o centro de atenções, e de cobiça, por onde passava.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  1962

A tímida estreia do fenômeno Beatles

Três acordes, letra simplória e um vocal agradável. Não era la grande coisa, mas "Love me do" abriu uma importante porta para quatro pobres e esperançosos rapazes de Liverpool. Gravado no dia 11 de setembro de 1962, no estúdio 2 de Abbey Road, em Londres, o primeiro compacto dos Beatles, que tinha "P.S. I love you" no lado B. chegou a ficar encalhado na loja de Brian Epstein, que havia comprado 10 mil cópias para vender. Epstein, por sinal, era também o empresário do grupo. O produtor George Martin conseguira aquela gravação pela Parlophone, uma pequena divisão da poderosa EMI, mas não se entusiasmara muito em divulgar a musica, que tocou pela primeira vez na Radio Luxemburgo, enchendo de orgulho John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e, principalmente, Ringo Starr, o baterista mais sortudo do mundo. Ele havia substituído Pete Best algumas semanas antes, numa polemica decisão tomada pelos outros três membros da banda.

Ringo, por pouco, também não foi excluído da gravação. George Martin preferia contar com o experiente Andy White, mas, percebendo a decepção do novo baterista dos Beatles, resolveu dar-lhe uma chance. Os dois gravariam e a melhor versão sairia no disco. Ringo suou a camisa. Foi ele quem tocou em "Love me do", mas em "P.S. I love you" limitou-se a chacoalhar umas ridículas maracas. Mesmo assim, seu nome saiu creditado também no lado B. quando o disco foi lançado, em 4 de outubro. A mesma sorte não tiveram os produtores da Decca Records, que em janeiro deram uma chance ao grupo, ainda com Pete Best, mas não o aprovaram, preferindo fechar com um tal de Brian Poole and the Tremeloes.

Musico de formacão erudita, George Martin, que mais tarde seria chamado de "o quinto beatle", achou que "Love me do" ficava bem melhor com um riff de gaita que John Lennon copiara de "Hey baby", sucesso da época. E claro que, depois de algumas dezenas de ensaios, o beatle já estava com a boca dormente. Mas tudo era valido em busca do sucesso. Nessa época, já tendo adotado o visual proposto por Epstein, com terninhos e alentadas franjas caindo na testa, o grupo tinha um grande fã-clube em Liverpool. Ainda mais quando, no dia 13 de dezembro, "Love me do" chegou a 17" lugar entre os 100 discos mais vendidos na Grã-Bretanha, segundo o jornal "New Musical Express", isso numa época em que as paradas eram dominadas por nomes como Ray Charles. Logo depois, viriam "Please please me" e toda a histeria beatlemaníaca.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  1962

Warhol transforma clichê em arte

Andy Warhol dizia que pintava porque queria ser uma maquina, o que pode ser confirmado pelo sugestivo nome de seu ateliê prateado, Factory (Fabrica), e pela exposição que consagrou a arte pop nos EUA, em 1962. No mesmo ano em que dois outros importantes nomes do movimento, Roy Lichtenstein e Claes Oldenburg, expunham seus plásticos conceitos pop em Nova York, Warhol mostrou sua serie das latas vermelhas e brancas de sopa Campbell's—uma das marcas mais famosas dos supermercados americanos—na Sidney Janis Gallery. Por que a Campbell's? Warhol respondeu: "Porque eu comi aquela sopa durante 20 anos, quase todos os dias, sempre a mesma coisa. Alguém me disse que a minha vida me dominou; e esta idéia me agrada".

Artista excêntrico e autor de boas frases de efeito (como a celebre "No futuro todo mundo terá seus 15 minutos de fama"), Warhol apostou tudo em produtos tipicamente industriais, feitos em linhas de produção para consumo rápido. As sopas Campbell's estavam de pleno acordo com aquilo que para muitos não era arte, mas logo se espalharia na mesma velocidade da cultura de massa, seu suporte necessário como fonte de inspiração e divulgação. Imagens como aquelas (esse foi um dos últimos trabalhos feitos a mão por Warhol, ja que depois ele faria serigrafias e reproduções de mitos, como Marilyn Monroe e Elvis Presley) eram tidas pelos puristas como vulgares e indignas de apreciação estética.

Para Warhol, não havia nada demais naquele trabalho praticamente impessoal, cuja matéria-prima podia ser encontrada em qualquer supermercado, uma das muitas banalidades do mundo industrial que seriam imortalizadas pelos artistas pop. As próprias cédulas de dólar, o símbolo máximo do capitalismo, seriam pintadas naquele ano, como que para dar-lhes um novo significado. As sopas Campbell's acabaram demarcando o limite entre obra de arte e mercadoria de consumo, uma discussão que se estendeu a partir da reprodução em serie, fomentando a discussão sobre se as cópias também seriam obras de arte ou apenas o original teria esse status. Warhol acabaria resolvendo a questão da forma mais pop possível, radicalizando de vez a diferença e evitando qualquer tipo de significado para seus trabalhos. O artista Roy Lichtenstein arremataria toda essa questão conceitual com a melhor definição da pop art: "Eu tento usar um clichê —um poderoso clichê—e exibi-lo de uma forma organizada".

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1962 

Garrincha baila; os outros ‘dançam’

Quatro anos depois de ter surpreendido o mundo do futebol com um time de sonhos sobretudo com o então menino Pelé, de 17 anos, e um gênio de pernas tortas chamado Garrincha, o time brasileiro campeão do mundo na Suécia, em 1958, voltava como favorito ao titulo da Copa organizada pelo Chile, em 1962.

O futebol de Pelé estava no apogeu e o Santos, clube do supercraque, deslumbrava platéias nas Américas e na Europa. O time do Brasil estava um pouco mais velho e algo modificado em relação a Copa anterior. O técnico, desde 1961, deixara de ser o campeão Vicente Feola, substituído por Aimoré Moreira. A zaga já não era composta pelos vascaínos Bellini e Orlando, e sim pelo santista Mauro e pelo banguense Zózimo. No mais, entrou nos campos chilenos a mesma orquestra de 1958 ate mesmo com Zagalo na ponta-esquerda, pois o santista Pepe, então titular indiscutível, machucou-se as vésperas da Copa.

Pela primeira vez, as imagens dos jogos chegaram para os brasileiros na integra, gravadas em videoteipe e exibidas na TV um dia depois da partida. Anunciava-se um show completo de arte e magia. Os jogadores não decepcionaram, encantando os amantes do futebol-arte com gols sensacionais. Pele não chegou a fazer nenhum—saiu da Copa no segundo jogo, depois de distender a coxa, uma dor compartilhada por todo o Brasil. O botafoguense Amarildo, que o substituiu, garantiu a presença da seleção nas quartas-de-final, ao fazer dois gols de virada contra a Espanha nos 20 minutos finais da partida. A partir dai, Garrincha assumiu a batuta. O Brasil venceu a Inglaterra nas quartas-de-final (3x1), o Chile na semifinal (4x2) e a Tchecoslovaquia (3x1) na partida que rendeu ao pais o bicampeonato. Garrincha, a "alegria do povo", deu um baile. E os outros times "dançaram", na vã tentativa de acompanhar seu ritmo.

Fonte: O Globo - Texto integral